Sem notícias do pai desde segunda, 27 de fevereiro, as duas filhas visitaram a terra de Sebastião para procurá-lo. Não o encontraram, mas viram toda sua plantação de cacau destruída pelos tratores
Publicado em 01 de março de 2012
Por Xingu Vivo
O agricultor Sebastião Pereira, marido de Maria das Graças Militão, proprietária de dois lotes de terra que hoje pertencem à Norte Energia, localizados onde agora se constrói o canteiro de obras do Sítio Pimental da Usina Hidrelétrica Belo Monte, foi expropriado, não recebeu indenização, foi ameaçado de morte e está desaparecido desde segunda-feira, dia 27 de fevereiro.Por Xingu Vivo

O agricultor em sua casa, dois dias antes de desaparecer
Isso aconteceu em setembro passado. Sebastião ainda não recebeu o dinheiro que deveria ter sido pago pela empresa.
Sebastião, 67 anos, está desaparecido. É agricultor. Cultivava cacau, açaí, abacaxi, castanhas. Suas plantações foram destruídas pelas máquinas que constroem a Usina Hidrelétrica Belo Monte. Havia uma sentença judicial, baseada em um Decreto de Utilidade Pública (DUP) emitido pelo governo federal, que permitia a empresa a expropriá-lo, destruir sua casa e espoliá-lo, sem que recebesse a indenização.
Sebastião, no entanto, nunca saiu de sua terra. Tem uma personalidade forte e singular, e com ela construiu boa relação com os funcionários do consórcio – estes permitiam que ele transitasse por sua terra e utilizasse as estradas privatizadas dos canteiros, mesmo depois de ter sido expropriado. Conseguia todo tipo de carona – para ele e o escoamento da produção. Pura camaradagem e empatia. Enquanto isso, na cidade, sua esposa cuidava do processo judicial que reivindica a indenização e que pode levá-los a receber uma indenização menos injusta.

Estrada privativa por onde Sebastião acessava sua terra
Contudo, os guardas do canteiro não permitiram que ele entrasse.
Sebastião foi ameaçado de morte.
Segundo relato de um funcionário da empresa à família de Sebastião, o agricultor teria dito aos guardas que ele entraria de qualquer jeito, e que enquanto não o pagassem, ele não deixaria a terra e continuaria trabalhando lá: “Vocês só derrubam o meu cacau se me matarem primeiro”. “Então é isso o que vai acontecer com você. Você vai morrer”, teria sido a resposta dos guardas. No impasse, Sebastião entrou pela mata, abrindo uma picada com o facão. Desde então, não foi mais visto.

Filha de 14 anos percorre cacaueiro cultivado pelo pai

Em silêncio, seguranças e encarregados ouvem aos questionamentos da filha de Sebastião
As meninas choravam muito pisando o cacau caído, como gente grande. Em casa, o filhinho, 5, chorava muito como o menininho que era. A mãe vestia uma camisa do Sepultura, do filho mais velho, maquiagem borrada. E vão esperando Sebastião chegar.
Mas Sebastião, que nasceu em Alagoas, que mudou para São Paulo e para o Paraná e para o Mato Grosso e enfim para o Pará, onde afinal plantou o cacau que o dava de comer e ensinou a filha a tocar guitarra, ainda não veio.

Texto e fotos: Ruy Sposati
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